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venerdì 29 marzo 2013

Protocolos


0. "Ninguém sabe que protocolo seguir porque não há precedentes", diz a curia do vaticano sobre o encontro entre os papas.

1. A salvação, como escrever um texto, não tem protocolo. Todo o resto parece que tem. O protocolo protege quem faz. É como uma liturgia em um monastério do tipo da que fala Agamben. É a roupa do monge que protege sua nudez. Não foi quem é o monge que fez, foi o monge. As descrições são litúrgicas - eu sou investido de funcionário, professor, proprietário, amante, amor da tua vida. E tudo o que eu faço bem ou mal é banal: a liturgia requer, a liturgia exige, a liturgia me salva. Sem a roupa do monge, estou exposto.

2. Há um protocolo para ensinar, para comer, para amar, para desamar. Saber viver é saber a liturgia. Os cabelos do mar são estes protocolos nos quais nos agarramos, ou um protocolo ou outro - ou sou uma coisa, ou sou outra. Os protocolos são muitos, os embaraços são mais.

3. Como eu me confundo com os embaraços, eu amo os protocolos. Sobretudo aqueles que compõem a liturgia da descontração.

4. Sou um devoto velado do Senhor dos Protocolos, mas não gosto deles. Eles me salvam das vertigens desconcertantes de estar apaixonado, de estar entusiasmado, de estar possuído, de estar encorporado, de estar inspirado, de estar atormentado. Mas não gosto deles.

5. Eles se propagam como ratos, como micróbios no clima que gostam, como pragas na primavera. O ambiente é propício aos protocolos. A falta que a vida regrada faz à vida - parece que minha missão é pintar de instituição os minutos que passem a esmo. O improviso desconcerta: é quase sempre irrepetido, quando é cópia não é autenticada, quando é autêntico não tem direção. É o descontrole que produz o mal que não é banal? Os protocolos me eximem. Salvar se parece já com ser eximido - não estar na lista dos que podem ser imolados. Eu perco minha agência, salvo minha pele. Exceto não se parece mais minha pele a que está salva. O protocolo é o substituto da salvação.

6. "Esta é a nossa casa. Aqui cada um pode ser o que quiser." diz Eliana Carneiro em seu espetáculo Blima. A personagem é talvez reminiscente de Blima de Shirley Russak Wachtel - uma sobrevivente polonesa dos campos. Ela aponta para o próprio corpo e para o mundo: a casa, onde cada um pode ser o que quiser. Mas os campos não estão assim tão longe de casa. Em Sorstalanság de Kertezs, Gyuri Köves estranha a imagem de uma vida protocolada que aqueles que ficaram em Budapest tinham. Nós também gargalhávamos, nós também nos entediávamos. Não há protocolo para a gargalhada se ela é um riso ingovernado - não há protocolo para o tédio. Estes estados são avassaladores. Eu me perco da minha casa. Ela não está entre quatro paredes.

7. Uma vez, em um acampamento judeu, me treinaram para dar o cara à tapa. Não sei se era um treinamento para a culpa, para a guerra ou para a misericórdia. Não entendi a lição. Se eu exorcizo os protocolos, ponho minha cara a tapa. Apareço mais do que deveria. O protocolo parece as vezes carregar um senso de respeito: uso esta liturgia pelos outros. É que o protocolo evita que a questão do respeito apareça. Eu me protejo - protejo também o meu senso de respeito.

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