Visualizzazioni totali

sabato 21 settembre 2013

Rala estância

Para Luciana Ferreira

Olho embaixo das ânsias frenéticas,
das pressas e também das tectônicas vagarosas
dos deslocamentos imperceptíveis,
debaixo das rugas e de suas pitonisas,
debaixo dos músculos dos obeliscos
e encontro: umas ralidades.
Me dizem que é monstruosa a pele sem carne,
a aparência com nada por trás,
não com um outro por trás
não com um mesmo por trás
- mais nada a evidenciar.
É flor de plástico plantada na floresta
e sépalas, e caule, e viço.
Tomo um fôlego ouvindo um estorninho de barriga preta,
ele peleja.
Tomo meu fôlego com a cabeça nos monstros
cheios de sombras que não parecem ser coisa alguma,
só assombrações nos condomínios do ser.
Eles se mexem, se espraiam, se espalham,
podem ficar impercebidos
como quem dexiste, como quem vive em um ninho
de arrepios, de capinzais e de lutos.
Eles sussurram o que eu não compreendo.
Nada, nada, nada mais. Não fazem enganos,
nem labirintos, nem substâncias.
Ébria estância. Nadando sob olhos horríveis
sem pés, sem pontas, sem parapeitos.



mercoledì 11 settembre 2013

Uma manhã na velha casa de alguém

Passei anos tentando viver. Parecia que eu estava com todas as minhas válvulas (ou são veias?) entretidas com sangue, com o ronronar dos ossos em gestos, com os elementos mesmo que constituem o âmago das coisas, ainda que eu achasse que coisas não tem âmago e têm não mais que bagaços feitos de outras coisas sem âmagos. Eu escrevia: não há âmagos, desistam, não há âmagos. E, no entanto, parecia que eu respirava âmagos - e, ainda mais âmagos, se o ar era amargo. Procurava o amargo. Queria meus muitos anos de vida, dia após dia. Acreditava que estaria em breve quites com deus - nem ele precisaria me perdoar, nem eu aceitaria seus perdões. Os músculos do mundo teriam provado estarem em completa sintonia com os das minhas entranhas - aqueles tão claros, distintos, grandiosos, perfeitos, decididos e vazios e estes tão retorcidos, íntimos, mal-iluminados e regados a sangue. E, no entanto, não eram válvulas, eram botões de girar de uma máquina que eu podia desmontar, despedaçar e a máquina era uma versão multi-dimensional da tal mola pra adaptar-me. Devia ser que há um ritmo comum a ser dançado entre meus oceanos e as pedras pegando fogo lá fora.

- Eu não sei como é que se vive.

De súbito hoje, numa manhã de fim de inverno, abdiquei. Já nem sei mais o que abdiquei porque passei todo um parágrafo descrevendo o que eu abdicava. E então já mudaram os ares. Abdiquei - vejo bem o que foi que eu abdiquei, mas vejo tanto que já não vejo mais nada além. Era preciso não demorar em dizer não. Mas aquela minha bromélia tinha caule para florir e eu tinha ventre para hesitar. Abdicar. Abdicar das proporcionalidades. Tortuoso. Uma vida não é um acoplamento com o cosmos - é um desajuste. Olho meu ambiente controlado - ou seriam também os becos controlados, as florestas, os desejos insidiosos. Meu ambiente controlado e cheio de catábases, de abridores de excessos, de buracos homicidas entre as aparências domésticas. Não sei mais o que eu acordei abdicando, aperto entre meus dedos uma pedra falsa. Uma pedra. Todas as coisas carregam perigos - os bichos de pelúcia, os gatos, meus sorrisos, os recém-nascidos. Se tudo pode ser outro, há em cada molécula uma interpretação. E neste mundo em que tudo está em desrepouso, ninguém é estrangeiro em particular e nada pousa como um nativo. No momento que eu fui ligado hoje, não tinha ambiente. Sem mais pregos para os meus martelos. Jogar pedras nas moléculas mesmo que elas não sejam minhas. Nem sejam tijolos. Nem possam ser coisa alguma. Nem moléculas.

E ainda assim, nada acontece - de Nuno Oliveira

“Deus salva mas nada acontece”
por Nuno Oliveira


O ESTILO E A PARANÓIA


Sendo contrário à minha forma de estar nas artes, entendo que uma das formas comuns de analisar uma boa de uma má peça de arte, possa ser pela excelência de estilo do executor "le style c'est l'homme même", e também que é o estilo uma coisa de extrema dificuldade de se conseguir, que é o estilo aquilo que é único no executor (autoria) e o define como artista, ou escritor (no caso da escrita).
Só se consegue um estilo, analisando todos os outros autores de um meio, escrita, pintura, escultura, cinema, outros, analisando todos os outros e recriando uma direcção. Um algo que desafogue o mundo de uma infinita repetição que não acrescenta.
Daí dizer-se que um bom escritor é antes de mais um bom leitor. Assim também se entende porque se afirma muitas vezes o grau de acuidade de um autor, analisando o seu rigor como estudante, o seu mérito académico.
Eu por outro lado e apesar de detestar a frustração, inerente à impossibilidade de entrar no meio artístico, percebo que não entro nesta categoria, sei que está acima de mim, a culpa é minha por falta de paciência.
Sei que muitas vezes levado pela ansiedade, o único que me interessa é mesmo o poder existir, poucos são os outros autores que me chamam à atenção, muitas vezes deles me chateio tantas quantas de mim.
Mas tenho que admitir que não tenho estilo, acho que me falta textura e paciência na escrita (neste caso, o meio que uso aqui), a ideia de produção como recriações, uma certa pesquisa de conhecimento, que funciona por busca paciente de um estereotipo comunicante, aborrece-me.

*

Acabei por desembocar numa visão de arte como paranóia por oposição a uma ideia de arte como estilo.
Algo prosaico contrário a uma lógica histórica que defende o estilo como um normal processo evolutivo histórico.
A ideia de paranóia refere-se, a uma resolução de realidade, de entendimento do que é ficção. Um pensamento em paranóia procura antes de mais a verdade da sua imaginação, uma imaginação sem fundo, uma forma de afirmar e aceitar o seu principio de loucura (engano).
A mim parece-me que existimos sempre entre a paranóia e o fantasma da dispersão.
Porque só sabemos o que somos, enquanto exagero imaginativo, em segunda mão, pelo reflexo que o mundo e os outros nos dá. E no esforço de racionalizar essa imaginação (a visão que os outros tem de nós), sempre nos dispersamos também; porque nos adequamos a uma alucinação colectiva que mesmo que refreada não dominamos.
O estilo neste contexto poderá ser contrário à ambição imaginativa, à paranóia, visto que esta não se quer refreada pelo social. No estilo, o -verdadeiro artista- parece antes de mais um dominado e um dominador, refreia a sua paranóia, não a confunde com o seu produto artístico, é um controlador da sua imaginação.
É de referir também que quem trabalha o seu sistema de ficção sobre o real, suportando o erro os excessos da sua mente delirante, tem tendência a viver esta hiperrealidade encontrada, de forma moralista. Porque se desencontra: de um pensamento desinteressado sobre o quotidiano, da negociação social focada na aspereza de um consenso generalista.
A confusão que faz em vida, mistura-se com a abestração que é o social, e repensa-se a ele e o todo como uma coisa só.

*

Estilo é a definição de que um autor é singularidade no social. E aqui teríamos que pensar o que é o social ou que é o espaço publico hoje para as artes, o espaço onde se redefine a representação do que é publico (tenho que ser sincero não faço ideia do que isto seja).
Paranóia é a definição de singularidade de um autor face a si próprio.
Assim a modo de conclusão diria que a paranóia é o que possuimos como certo e que o estilo pouco passará de uma vaidade.