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venerdì 28 novembre 2014

Ivaluardjuk

Para Lucas

Drogas, entorpecentes, substâncias (como se nada mais fosse, como se algo fosse), alucinógenos, plantas de poder (como se elas tivessem um ministério ou uma secretaria de Estado), psicodélicos, ontodélicos, geodélicos, tóxicos. Não sei falar delas. Nem sequer sei se todas elas tem o mesmo pedigree...
- Os antropólogos, ou a maioria deles, não fala dos acoplamentos entre as gentes que eles estudam e as ervas que elas ingerem. O Sonho dos totemistas da Austrália é a visão primordial que aparece em uma forma de consciência alterada. Mas os antropólogos preferem não falar das ervas associadas aos totens. Preferem deixar os totens ilúcidos, diz o Lucas.
Deve ser, eu penso, que não há mesmo uma antropologia, porque cada humano é uma circuitaria que envolve muitos tipos diferentes de elementos não-humanos. Não há Terenas, não há Campas, não há Arandas, não há Totonacas a não ser como associações de ingestões, de digestões, de rejeições. Cada uma destes emaranhados tem que ser tecido e retecido todos os dias - com materiais anônimos ou com as almas comidas. Uma gestão. Não há um máximo fator comum puramente humano por trás das associações devoradoras com os não-humanos. É por isso, eu digo, que não temos palavras para esta flora e fauna constituintes. Alteração de consciência - como se a consciência estivesse pronta e fosse alterada. Há coletivos, com elementos intragestivos e extragestivos. O tubo é que é o rio por onde nunca passa a mesma boiada duas vezes.
- Mas quando é que um estado entre tantos, uma certa configuração biológica, passou a ter estabilidade e a lucidez virou uma substância selada, certificada, etiquetada e empacotada?
O Lucas pergunta da caça às bruxas microbióticas. Pergunta às nuvens de chuva se armando no fim da manhã de novembro. Pergunta a uma Silvia Federici que procure o capitalismo nos rastros das microbiotas. Um regime alimentar, eu digo, é um regime: nós aprendemos que somos onívoros, e que tudo é comida. Comida, não mais que comida. Não é dádiva do não-humano. Não é roubo do não-humano. Não é peregrinação ao não- humano. Nem é acordo com o não-humano. É comida. Como se comer um boi fosse como comer um musgo. E chamar todo o resto de comida - nós não somos comida - é uma camuflagem.
- Mas a digestão, ele diz. Nas horas da digestão, a humanidade está em risco no corpo. É preciso andar na ponta dos pés como se estivéssemos no meio de um campo de batalha. Almoçou e tomou banho...
Na barriga, o palmito grudou na costela; a medula revirava soltando polvilho. Era uma tontura destas que não é nem ribanceira acima ou ribanceira abaixo. Era um estrangeiro em mim, muito acomodado, que eu acossava. Eu me contorço disfarçado: colocamos muitos joules de energia do planeta a serviço de manter a humanidade humana. Repetindo uma receita de híbrido. É um trabalho feito na surdina, como tantos outros nos supermercados, por trás das embalagens, dos pacotes, dos trabalhadores mal-pagos que carregam toneladas de mantimentos para as prateleiras da loja.





lunedì 24 novembre 2014

Namenlos

Todo acontecimento tem uma medula?
E nasce de um grotão como o que se passa conosco?
Um Rilke citado por C. Virgil Gheorghiu na página 383 da edição Bertrand
que traduz A Vigésima Quinta Hora, bem na hora em que
Traian Koruga se mata com um tiro dos outros
no último campo:
Erde du Liebe, ich will...
Namenlos, bin ich zu dir entschlossen - von weit her.

Tudo o que vem à terra vem assim de weit?
Ou apenas nós, medula de aço, nos entregamos à terra
como estrangeiros desconhecidos?

giovedì 20 novembre 2014

Carnaval e catástrofes

Um post deste blog de fevereiro de 2008, inspirou o texto que publico com o Ricardo Lobato em um livro sobre Carnaval e Filosofia a ser publicado em breve. Copio aqui dois trechos (um do início e um do meio do artigo):

Nas vésperas do desfile das escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro de 2008, uma liminar da Justiça estadual impediu o desfile do carro alegórico que representava o terror dos campos de concentração e extermínio no enredo da Viradouro. O enredo tratava do que traz arrepio: dos maravilhamentos aos êxtases, dos medos aos horrores. A Shoah – a catástrofe judaica que adveio em concomitância com a Segunda Guerra Mundial - tem sido considerada um dos horrores da história recente e utilizada muitas vezes como parâmetro de massacre e extermínio,. Este parâmetro é usado nas comparações com a catástrofe palestina que se seguiu a 1948 (a Nakhba) , em outros massacres coloniais e até com o trato genocida de animais, como deixa explícito os discursos de Elizabeth Costelo no romance homônimo de Coetzee (2004). Ela é também uma medida das capacidades de controle pela destruição na modernidade (Bauman, 1989; Agamben, 2008). As imagens dos campos de concentração e das câmaras de gás se tornaram ícones do apavorante, da extrema violência e da crueldade na cultura ocidental. Muitos filmes, romances, peças de teatro e até mesmo poemas foram feitos sobre o extermínio como partes de diferentes mensagens e mostrando os acontecimentos sob diferentes vieses. Até então o tema não tinha aparecido nos desfiles de escolas de samba.

A liminar foi apresentada pela Federação Israelita do Rio de Janeiro alegando que o tema da Shoah era inapropriado para um desfile de carnaval, que tem espírito festivo e de alegria, humor, descontração e erotismo. Os desfiles não seriam lugar apropriado para pensar o horror – nem sequer sob a forma da questão sobre o corpo arrepiado – já que estão confinados à festa, onde não caberiam certos pensamentos. A liminar insinua que o tema da catástrofe judaica cabe em filmes, romances e até em poemas – mas não em desfiles de escola de samba. Que pensamento foi este que impediu a exibição do carro preparado pela Viradouro para representar a catástrofe? Aquele quinto carro teve que ser substituído por uma alegoria sobre a censura onde se lia “Liberdade ainda que tardia – Não se constrói futuro enterrando a história” em meio a pessoas amordaçadas – e uma imagem de Tiradentes. O carro com a escultura dos corpos retirados da câmara de gás não desfilou. Em seu lugar, o arrepio da mordaça.

Um dos elementos alegados pelo pedido de proibição da exibição da alegoria pela Federação Israelita do Rio de Janeiro foi o plano do carnavalesco, Paulo Barros, de colocar um passista vestido de Hitler sobre o carro no desfile. Paulo Barros havia já vinha introduzindo inovações em carros alegóricos nos desfiles que fez para a Unidos da Tijuca desde 2004. A concepção de Barros era de colocar elementos humanos na escultura das alegorias – e ao invés de passistas sobre um púlpito, ele introduziu dançarinos em grande quantidade fazendo movimentos sincronizados. A sincronia da dança dava um elemento vivo à alegoria ela mesma, e os movimentos refletiam eles também elementos do enredo. Foi assim com o carro do DNA onde pessoas pintadas de azul faziam movimentos espiralados. Também foi assim com os amordaçados que vieram na alegoria que substituiu aquela que havia sido proibida: pessoas amordaçadas faziam movimentos sincronizados, não dançavam samba, não eram passistas. Na Viradouro, Barros pretendia com este enredo transversal, tentar pensar o arrepio que, como algumas outras reações corporais, responde a humores muito distintos.

[...]

Nos últimos 50 anos, as escolas de samba aceleraram sua história tornando possíveis muitas transformações que vieram a permitir que diferentes coisas passassem a ser tematizáveis nos desfiles. Um elemento importante introduzido pelos desfiles do Salgueiro de Fernando Pamplona e Arlindo Rodrigues nos anos 60 e início dos anos 70 foi os temas da história africana do Brasil. Pamplona, formado na Escola de Belas Artes do Rio e cenógrafo do Teatro Municipal, entrou no carnaval do Salgueiro em 1960 e procurou um enredo histórico ainda não abordado pelos desfiles no passado. Obteve naquele ano o primeiro título para o Salgueiro com o enredo sobre Zumbi dos Palmares. Em 1963 o Salgueiro ganhou outra vez o carnaval sozinho pela primeira vez com um enredo que tratava de Chica da Silva, como uma heroína negra. No ano seguinte, foi a vez de Chico Rei.

O desfile de 1964 foi, portanto, sobre a Maafa – a catástrofe africana. A Maafa foi composta pela organização de campos de trabalho forçado em dois ou três continentes, pelo organização da vida das pessoas em função da produção, do tráfico sistemático de pessoas e do extermínio de todos aqueles considerados inadequados para o regime de escravidão (ver, por exemplo, Roberson 1995) Assim como a Shoah ou outras catástrofes, a Maafa também foi um episódio (longo) de escravização e genocídio cometido de maneira sistemática e legitimada de tal maneira que não havia espaço, no sistema escravagista, para nenhum recurso, nenhum apelo, nenhuma instância de implementação de justiça. Assim como a catástrofe judaica, a catástrofe africana também é vista pela história dos vencedores como o massacre contra um povo (ou um conjunto dos povos). Do ponto de vista dos escravizados e dizimados, trata-se de um ataque sem razão nenhuma. Sem presságio. Sem antecedentes. Sem fio condutor. Como diz o samba do Salgueiro daquele ano, “um dia, ...[a] tranquilidade sucumbiu, quando os portugueses invadiram, capturando homens para fazê-los escravos no Brasil”.

A história contada no enredo do Salgueiro – a de Chico Rei – é uma história de adaptação ao status quo escravocrata. O rei capturado compra sua alforria – e a alforria de seu pessoal – e depois compra terras e tem escravos, adota o nome de Francisco e se converte ao catolicismo e, por fim, ergue a igreja de Santa Efigênia do Alto da Cruz em Ouro Preto, uma igreja para os negros alforriados. Trata-se de uma história de cooptação do escravo – mas também, como viu o enredo de Pamplona, de uma história negra de êxito. Uma história, contudo, traçada pela migração forçada, pelas mortes precoces e pelo assassinato dos inábeis. Também pela destituição de toda uma maneira de pensar e de saber – a cooptação de Chico Rei coroa um epistemicídio sistemático.
Os carros de navios negreiros, com todo seu sofrimento e desolação, passaram a se multiplicar nos desfiles. O tema já havia sido enredo do Salgueiro em 1957 (“Navio Negreiro”), e continuou sendo uma constante nos carnavais. Por exemplo, em 2012 dois carros exuberantes de navios negreiros entraram na avenida, da Beija-Flor (em “São Luís – Poema Encantado de Amor”) e da Vila Isabel (em “Você Semba De Lá Que Eu Sambo De Cá – o Canto Livre de Angola”). Nestas alegorias, frequentemente há passistas que seguem a cadência da escola, sorriem e dançam. Talvez se possa dizer que a presença dos navios negreiros banalizou a Maafa e que, talvez, a liminar procurou evitar que o mesmo se desse com a Shoah. O argumento não está presente nos documentos que nortearam a proibição do carro alegórico da Viradouro em 2008 que não faz nenhuma menção à catástrofe africana e nem sequer ao que aparece nos desfiles das escolas nos últimos anos.

Porém o argumento em si mesmo é duvidoso: os muitos carros alegóricos fizeram parte de uma presença constante do tema da catástrofe africana no carnaval em um país onde não há sequer um museu dedicado ao massacre perpetrado pelo status quo brasileiro e por seu antecedente colonial. Ainda que possa ter banalizado a associação entre carnaval e navios negreiros, as alegorias fixaram na cabeça do público que foi através de navios de concentração que a população africana chegou para quase toda morrer nos campos de trabalhos forçados no Brasil. Os carros também evocam a destituição dos coletivos que foi a catástrofe africana. Talvez um efeito similar pudesse ser alcançado com alegorias como aquela que Paulo Barros tentou colocar na Sapucaí. Talvez a história de muitos judeus, ciganos e outras vítimas da Shoah no Brasil ficasse evidenciada e refletida pela alegoria. De todo modo, aquilo que os desfiles promovem é múltiplo: é da ordem de um resgate de uma identidade, mas também da capacidade de crueldade, da memória e, potencialmente, do arrepiante.

Neurogenesis (by divij b.c)

Freaked out on the stair,
while staring at a hunchbacks flair.
soon he damn turned in to a flare.
Flames caught the curious eyes of a baby picture
collapsed in to pieces of a feathered creature,
tried to cry on the death of a faceless preacher.
Did i make this human portrait
which looks like a piece of wrinkled paper.

mercoledì 19 novembre 2014

Yes, indeed, words and us teach each other

fragmented, fragmented
tormented, tormented
demented, demented
cemented, cemented

i got it