O mundo é um punhado de acontecimentos
e um poema é um entulho de palavras.
Mas o entulho de palavras
quer dar abrigo ao mundo,
gritar com ele,
fazer acontecimentos,
como se fosse mundo também.
O punhado de acontecimentos
se esconde no entulho de palavras.
Eles se camuflam um no outro,
fatos parecem estrofes, rimas viram verdades.
Às vezes parece que podemos dividir
as palavras e os acontecimentos:
poemas à esquerda, o mundo à direita.
Mas basta movermos a cabeça uns centímetros
e eles misturam. Tudo entra em métrica.
Às vezes, um entulho de palavras cerca as coisas,
um punhado de acontecimento se veste de palavras.
Quem vê, vê tudo.
Ninguém vê sem versos
porque sem versos
o mundo parece que ocorre sem direção,
corre sem rima, rima sem estrofe.
As palavras usadas seguram as coisas,
parecem nós cegos, com fios finos
–– arrebentam com um verso que sopre,
e deixe as coisas escaparem
para fora da rima.
Palavras repetidas vão ficando duras.
Vão ficando sólidos perfeitos, que temos que contornar.
Nada é permanente sem um esmalte de palavras.
E as palavras são quase nada sem outras palavras;
sem todo o mundo elas não querem nada,
sem outras palavras elas não querem dizer nada.
Sem palavras não há coisas, só letras em diáspora
Que são só casca.
Entulhos de palavras às vezes se rimam,
em punhados de acontecimentos
Quando as palavras param
de rimar e calam ficam seus ecos, seus murmúrios–––
os acontecimentos não estancam.
Nessun commento:
Posta un commento