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domenica 14 giugno 2015

Não foi só um cavalo

Dona Electra, profetisa e quituteira, lê as cartas, as mãos, as borras do café
de toda a família Didi-Huberman depois do almoço; ela se senta
contra o sol, como se seus colares e broches e brincos e adereços
fossem escudos de Salomão, que convencem porque aberram:
- O que significa, eu lhe perguntei, sonhar com meu neto assim,
já de barbas brancas e subido em uma árvore da beira do Rio do Monge
e deixando no galho mais alto sua sunga verde?
O neto, ela imaginava, ágil, firme e holobionte,
teria talvez ficado pelado quando vigoroso desceu à superfície do chão.
Kinderland, me ouvi pensando, enquanto aguardava a pitonisa, já que seus olhos
se retiraram para o galho mais algo da castanheira e as pupilas
refletiam um sol mordaz mas que nos seus olhos ficava doméstico.
- É uma parte desprendida de você, um lampejo da tua vontade que não se curva
nas encruzilhadas, não calcula sua boa-vontade, e que já está muito acima da terra
onde você se arrasta. É um bom sonho, te ensina uma técnica da liberdade.
- Ensina, eu concordei. Mas por que, mãe Electra, eu preciso desta lição
agora que eu pinto estas grandes telas, todas de uma cor só, e minha experiência
se tornou completamente inconclusiva?
Ela fez um volteio com a cabeça, a feiticeira, não sei se para se livrar de mim
ou para me hipnotizar. Já não via na sua imagem um enxame de vaga-lumes e nem a pinga,
o maço de cigarro aberto, a caixa de fósforos comprada ainda ontem, a curva de 90 graus
entre os dois paralelepípedos. Ela não queria confissões. Eu só via a khora.

No outro dia, no café-da-manhã eu tomo um chá de cascas de abacaxi para minhas vísceras
já que elas me acordaram de noite pensando no desemprego: ter que rifar meu saxofone.
Ouço uma melodia das Pussy Riots, com as caras tapadas de não sei quantas cores,
uma melodia mixada. O rio tem afluentes.
Sinto minha cabeça cercada de pedaços de coisas próximas por todos os lados.
Meu couro cabeludo sempre foi líquido: clara de ovo, caco de vidro, nostalgia.
As Pussy Riots elas invadiram a catedral, há muitos anos atrás.
A catedral que era uma piscina soviética. E eu sou museu?




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