Visualizzazioni totali

domenica 7 luglio 2013

Testamento (quase pronto para as Noites Mortas)


Vim preparar para morrer.
Todos os dias.

Aprendi que morrer não é ir-se para o acabado,
é permanecer pela lama solta.
Não contemplando, mas se arrastando nas pedras, como musgos.
Não sobrevivendo depois de sobreviver,
mas seguindo sem ter com o que seguir
sem ter carne, nem osso, nem uma grama de tutano.
Vim preparar para despedaçar.
(Bater com os pés um ritmo centrífugo)

explodir.

Eu e a mariposa devorada pelos abutres e também
eu e o sol, prontos para se largarem de si,
já que nem tudo é vida.

Virar chão, virar pedra, virar matéria
sem órgãos.
Cada célula do meu corpo
veio aprender a ser inanimada.
Devorada.
Dissolvida.
Matéria cada vez mais bruta, cada vez mais prima
Ela, a fêmea de todas as esquivas: a matéria
Ela me pare, ela me para.
Em vida eu só tenho dela a pele.
Morrer é ter-lhe o âmago.

Há o outro lado, me contam as horas, sonhadas ou vigiadas.
Há o lado explícito, material, incontrolável e voluntarioso
de todas as coisas - aquilo do que eu sou feito:
as peles que chamo minhas, minhas rugas, meus calos.

O lado bruto, a parte prima, que nunca seguirá um caudilho.

Ingovernável.

Também meus pós preparam sua deriva
todos os dias sem substância, já desgovernados,
repetem os batalhões genéticos das moléculas
dos meus rins como quem vira Orfeu por um segundo
e se largam. Eles me preparam, me dobram, me enrugam.
Me vestem e me maquiam para ir para fora,
para fora da legislação.

E me devoram. Ganho intimidade com minhas bactérias
que me conhecem, por que são minhas outras de dentro,
minhas parceiras de corpo e que se aprontam
para fazer de mim o outro delas,
o outro de dentro.

Vim me preparar para misturar com o resto.
Todos os dias.
Aprendi que não é sair para fora, o resto é cosmos.
Fazer um ninho na tempestade, no fogo, no chorume
e cultivar o foro menos íntimo.
Preparar para captar pela epiderme
mais do que a aspereza e a suavidade das bordas,
os desacordos, as pulsações, as síncopes
do resto das coisas.

Preparar para engolir terra pagã,
sem hóstia, mas cheia de microdeuses e mocréias
de boca cheia.
Preparar para virar: virar boca, e ser abocanhado,
entregue às traças.

Por isso peço aos que me amarem:
por favor com cuidado, o meu cadáver, deixem no começo do caminho;
destroços aos corvos, aos vermes da terra,
às piranhas da correnteza, e também ao vento, ao fogo,
enterrem alguns ossos, me engulam se puderem, me enfiem no cosmos!
Quem tiver as vísceras prontas, sirva-se dos meus pedaços,
façam banquete, temperem a carne
com o que gostam
e me roam, osso a osso
largem os dejetos aos roedores,
os pequenos diabos dos vestíbulos,
os mestres de cerimônia do chão
os tapetes vermelhos
do céu aberto.


Nessun commento: